Registro Histórico


Avenida Alberto Torres

Até o ano de sua elevação à categoria de cidade, 1835, a Vila de Campos dos Goytacazes contava apenas com uma praça – Praça Principal ou da Nova Constituição, quatro largos – Rocio, Rosário, Pelourinho (ou do Capim) e das Verduras – e umas 25 ruas estreitas e tortas, sem calçadas e nem todas pavimentadas, segundo conta nas narrativas de Júlio Feydit “Subsídios para a História de Campos dos Goytacazes”.

Antiga Rua Nova da Constituição

Em 1835 era tomada pelo mato, fato que motivou a Câmara de Vereadores a deliberar pela limpeza e lhe dar novo traçado. Em 1844 foi prolongada até o Outeiro (Praça Barão do Rio Branco) e, em 1856, foi proposto seu alongamento até aos fundos do Cemitério da Coroa (Cemitério do Caju). Em 1889 foi feito seu nivelamento pela Companhia Ferro Carril para assentamento da linha de Bondes. Nela encontrando-se o Fórum (Câmara Municipal),m a Faculdade de Medicina de Campos, o Colégio Batista Fluminense e a igreja Boa Morte, cuja construção se iniciou em 1736.
Pelo que se supõe, historicamente, a Rua da Nova Constituição, na verdade, é uma homenagem à Constituição de 1824, correspondente à Carta do Primeiro Império de Pedro I, fato ocorrido logo após a Independência do Brasil, a 07 de Setembro de 1822. A Rua nasce no bojo do projeto urbanístico da Praça do Santíssimo Salvador e, curiosamente, permaneceu com este nome e, mesmo hoje, pessoas antigas ainda assim a denominam.
Foto de Alberto Torres
A nova nomenclatura, homenageando o político Dr. Alberto Torres é uma homenagem das mais justas ao filho de Itaborai e que apoiava o movimento das lideranças de Campos para a criação de uma Província, o que foi abortado pela intervenção do então presidente da República em exercício, Manuel Vitorino, isso em 1897, quando a idéia republicana era muito incipiente para um país (ainda) acostumado aos alvores da monarquia.
Era filho de Manuel Martins Torres, que foi vice-presidente no governo de José Porciúncula. Iniciou os seus estudos no Rio de Janeiro. Matriculou-se, em 1880, em São Paulo, matriculando-se na Faculdade de Direito, tendo também início, nesta mesma ocasião, a sua atividade jornalística, colaborando com jornais como “O Caiçara”, “A Idéia”, “O Constitucional” e “A Republica”. Bacharelou-se pela mesma Faculdade de Direito de São Paulo em 1886.
Regressando ao Rio de Janeiro, trabalhou como advogado no escritório de dois renomados profissionais, doutores Tomás Alves e Ubaldino do Amaral. Em 1889 foi nomeado promotor público, mas não aceitou. No mesmo ano, foi candidato a deputado pelo quarto distrito, sendo derrotado.
Entusiasta dos ideais republicanos, Alberto Torres funda em 1889, juntamente com outros publicistas, o jornal “O Povo”. Após a Proclamação da República, Torres torna-se deputado da Assembléia Constituinte fluminense instalada em 1º de março de 1892, exercendo cargo de deputado estadual até o ano seguinte. Em 1894 é eleito e inicia seu mandato de deputado federal.
Em 1895, o então presidente da República, Prudente de Morais nomeia Alberto Torres para o cargo de Ministro da Justiça e Negócios Interiores (30 de agosto de 1896 a 07 de janeiro de 1897), demitindo-se pouco tempo depois, em protesto pela intervenção na cidade de Campos dos Goytacazes decretada por Manuel Vitorino, substituto do presidente Prudente de Morais (1894 – 1898), que se submetera a uma intervenção cirúrgica na vesícula e, por isso, ficou afastado do Governo no período de quatro meses, em 1897.
Na realidade, a cidade de Campos dos Goytacazes/RJ realizou várias tentativas de se tornar uma capital política, segundo a tese descrita pela professora Dra. Isabel de Jesus Chrisóstomo, da Universidade Federal de Viçosa, para o Curso de Pós-Doutorado da École de Hautes Études (Universidade de Rochelle, França).
            No trabalho, intitulado “Campos: The Dreamed capital of a desired province – 1835 – 1897”, ela dá destaque a três movimentos que correspondem, simultaneamente, a três momentos políticos importantes: o primeiro, desenvolvido num tempo longo correspondeu o da construção das imagens e representações que serviram de mote pra a elaboração dos projetos de capital no século XIX;
            O segundo no ano de 1855, quando se esboçou um projeto de criação da Provincia dos Goytacazes e, finalmente, o terceiro em 1890, quando Campos reivindica ser a nova capital do então Estado do Rio de Janeiro. Assim, acredita-se que os motivos que levaram recorrentemente a cidade de Campos a lutar pela mudança do seu estatuto administrativo, estejam associados aos mecanismos empregados pelas elites locais para construir uma imagem de lugar central.
            Neste aspecto, coloca-se em discussão que o projeto de se tonar capital constituiu-se em uma das estratégias dos atores locais para expandir a sua influência política a partir do controle da terra. Um movimento que forjou novas espacialidades, utilizando-se de um discurso que associava o tema desenvolvimento ao de integração regional. Portanto, considera-se que o desejo de Campos de se tornar uma capital refletia a idéia de domínio político desta localidade sobre as demais em função da concentração de poder político e administrativo desta cidade.
            Alberto Torres ficou terrivelmente aborrecido, em virtude de Manuel Vitorino haver, nos quatro meses em que esteve à frente da Presidência da República, jogado um balde de água gelada nas pretensões dos campistas. A Província, que seria criada, em 1855, reunia, geograficamente, Campos dos Goytacazes (Italva e Cardoso Moreira), São João da Barra (São Francisco do Itabapoana) e São Fidélis.
            Entre 31 de dezembro de 1897 e 31 de dezembro de 1900, Alberto Torres exerce o mandado de Presidente do Estado do Rio de Janeiro e é sucedido por Quintino Bocaiúva. No ano seguinte, por decreto de 30 de abril de 1901, é nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal, cargo do qual se afasta em 1907, por motivos de saúde. Viaja à Europa e quando retorna ao Brasil lhe foi concedida a sua aposentadoria, por decreto de 18 de setembro de 1909, quando tinha 43 anos de idade.
            Foi ainda membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) desde 1911 e, ao abandonar a vida pública, Alberto Torres passa a dedicar seu tempo quase que exclusivamente ao estudo dos problemas políticos e sociológicos brasileiros. Seus restos mortais foram transferidos, posteriormente, para o Cemitério de Porto das Caixas, em Itaboraí.

Centro Histórico

            O centro histórico da cidade de Campos dos Goytacazes foi praticamente consolidado, a partir do Plano Urbanístico do sanitarista Francisco Rodrigues Saturnino de Brito, planejado em 1902, muito embora as obras de organização urbana somente tenham sido iniciadas após 1906, como registra a pesquisa da Dra. Teresa de Jesus Peixoto Faria, no texto “As reformas urbanas de Campos e suas contradições”.
            Ela cita, em sua pesquisa, que havia, além da reformulação urbanística, a necessidade de resolver questões d falta de saneamento, responsável pelas epidemias, como a peste bubônica, que assolou o município, situação agravada pela grande enchente verificada naquele ano, resultando em inundações, o que levou o médico Dr. Benedito Pereira Nunes, idealizador da “cidade saneada”, a observar que, em 1906, nada tinha sido feito com relação ao projeto de Saturnino de Brito. E fez o seguinte discurso, publicado na Gazeta do Povo, solicitando a intervenção do Governo Federal:

Em 1901, quando presidia a Câmara Municipal de Campos, eu disse que, realmente, Campos, doada de uma natureza e de situação topográficas excepcionais e que poderia ser chamada a Sultana da Paraíba se transformou, por negligências da engenharia indígena e da edificação colonial numa cidade de ruas tortuosas, de becos e de ruelas escuras, cheia de casebres obscuros e insalubres, criando, assim, um ambiente de condições idênticas às das cidades asiáticas, onde a peste é endêmica. Os velhos casebres que existem ainda hoje e onde vive a classe operária pagando baixos alugueis, confirmam este estado de coisas. Atentados flagrantes às regras de higiene, legitimando de maneira criminosa o direito dos proprietários pouco escrupulosos, exploradores conscientes dos pobres moradores de casebres úmidos, verdadeiros pardieiros pagos com o suor das vítimas.


            Tetê Peixoto assinala: E é o próprio prefeito Ferreira Landim que, em novembro de 1906, anuncia, em discurso também publicado no mesmo jornal, no qual fala nas dificuldades para colocar a arquitetura de suas habitações de conformidade com os novos modelos em difusão: “O problema de salubridade das habitações exige, mais do que nunca, a atenção do poder municipal. É necessário melhorar as condições de higiene das casas, transformar o sistema de edificações, expurgar a cidade dos velhos casebres, focos de infecções de toda a espécie – da tuberculose e da peste, principalmente. No ano passado, fiz demolir nos termos da lei, 45 desses velhos pardieiros e as enchentes completaram, em parte, esta obra de saneamento (...)”. A reforma urbana na cidade de Campos dos Goytacazes obedecia, em tese, ao que era feito no Rio de Janeiro, nos tempos de Pereira Passos, por volta de 1904.
            Da lista de demolições de velhos edifícios, publicados em seu trabalho, que parecem prejudicar a imagem da cidade constam 32 demolições e foram condenados 16; construíram-se nove casas novas; 18 foram totalmente reconstruídas, e 16 parcialmente; foram feitos 48 grandes reparos e 217 pequenos reparos. E o Dr. Pereira Nunes, condenou a cidade “velha”, segundo ele, invadida por ratos. E reafirma que “Campos reclama de medidas como impermeabilização do solo e a abertura de áreas de circulação”,
            No documento, a pesquisadora salienta (...) O velho tecido urbano é transformado, progressivamente, graças às reformas que visam, além do embelezamento da cidade, dar-lhe uma melhor funcionalidade, adaptando-a aos interesses da economia capitalista e da burguesia em plena ascensão. Finalmente, neste começo do século XX, é necessário dotar a cidade dos símbolos do progresso e de uma imagem de modernidade.
            E ele descreve algumas mudanças operacionalizadas com as reformas do Plano Saturnino de Brito: “As Ruas: 21 de Abril, Sete de Setembro, Constituição (Rua Alberto Torres) e Formosa (Tenente Coronel Cardoso) foram alargadas; a antiga Praça das Verduras (Praça do Chá-Chá-Chá) foi urbanizada e transformada em praça de lazer; a Praça São Salvador, já com belo jardim, é ornamentada com uma fonte, os edifícios se renovam como o Renne, o Café High-Life,m Bom Marché e novos edifícios surgiram, como o do Banco do Brasil (1910), Associação Comercial de Campos (1913), Correios e Telégrafos e sede da Lira de Apolo (1917) e o antigo Teatro Trianon (1921). Desses citados, somente sobreviveram o Renne (com mudanças nos anos 50) e a Lira de Apolo (ora em restauração).
            Hoje, o conjunto de obras ecléticas, o maior do interior do Estado, praticamente está restrito às Ruas: 21 de Abril, Santos Dumont, Teotônio Ferreira de Araújo (antiga Barão de Cotegipe), Praça do Santíssimo, Sete de Setembro, 21 de Abril, Avenida Rui Barbosa, Rua 13 de Maio (antiga Rua Direita) e Rua Formosa (Tenente Coronel Cardoso), embora existam outros espécimes da época espalhados por outras artérias da cidade, atingindo até bairros mais distantes e em alguns distritos, como Goytacazes, Dores de Macabu, Murundu, Santa Bárbara, Vila Nova, Morro do Coco, Santa Maria e Santo Eduardo. Só para citar alguns...
            O centro histórico de Campos é, com outros avanços ocorridos nos anos 40, por intervenção da empresa Coimbra Bueno, nos tempos áureos do Prefeito Salo Brand, que era engenheiro, o que estabelece a Lei (Plano Diretor) 7.972, de 30/03/2008, quando se inicia, embora tardiamente, a se adotar uma política de preservação do patrimônio Histórico e Cultural do Município, cuidando de suas instâncias materiais e imateriais.
           

Inventário em: 20/10/2014 – Valdimir da Silva Salino
Fotografia:
Responsável: Orávio de Campos Soares

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